domingo, 19 de dezembro de 2021

Annemarie Schwarzenbach- a suíça rebelde



  


“ Um anjo de Botticelli com agressividade de Joana D’Arc.” 

Sils,15 de Novembro de 1942.



A ciclista viu algumas amigas e, brincando, tirou as mãos do guidon para mostrar sua destreza.
 
Uma simples queda, traumatismo de crânio, meses de inconsciência, sequelas na fala, morte. 

Um acidente banal tira de cena Annemarie Schwarzenbach - para quem escrever era a terapia que freiava sua angústia e dominava as dolorosas  crises depressivas.
Annemarie Schwarzenbach, herdeira de um império têxtil, escritora, jornalista, fotógrafa e globe-trotter teve uma atribulada vida pessoal. 

Foi companheira, entre outras, de Ella Mailart ( 1903/1997), outra mulher extarordinária, que marcou a vida cultural da Suíça durante o século XX.
 
Sua biografia, “A Suíça  Rebelde “, filme premiado em vários Festivais na Europa e no Canadá ” foi escolhido o melhor documentário na 11ª edição do Festival Mixbrasil da Diversidade Sexual, realizado em São Paulo, em Novembro de 2003.


Zurique, 23 de Maio de 1908.

Nasce  Annemarie Minna Renée Schwarzenbach  , terceira filha de Alfred Emil Schwarzenbach - proprietário de um império têxtil - e de Renée de Wille.
 
Junto com os irmãos mais velhos Suzanne e Robert e o mais novo, Hans, passa a infância e a adolescência na mansão da família. 
 
Restabelecida de uma grave escarlatina, os primeiros estudos foram feitos com uma preceptora. Em seguida, frequentou os melhores internatos para moças ricas1931. 
Formada em História em Zurique e Paris, e tendo já publicado uma obra elogiada pela crítica - “Amigos de Bernhard” (editora Almathea), - estabeleceu-se em Berlim, onde foi acolhida pela elite intelectual e, em especial, pela família de Thomas Mann, escritor já laureado com o Nobel de Literatura.1932. 

Considerados transgressores, cercados por uma aura de escândalo e dependentes de morfina, os irmãos Erika e Klaus - filhos mais velhos de Mann -passaram a conviver intimamente com Annemarie que se apaixona por Erika Mann e, não correspondida, também se torna usuária da droga.
 
Incentivada pelos amigos, escreve a peça histórica “Cromwell” e a novela “Der Falkenkafig”, fruto da primeira viagem ao Oriente
.Este sucesso literário  inicial foi considerado pelos Schwartzenbach uma traição que lesava o prestígio familiar.
O relacionamento muito estreito com a mãe, de quem era a filha preferida, deteriora-se.

Preocupada com o julgamento da sociedade”, Renée de Wille, mãe opressora e sufocante, vivia tranquilamente seu relacionamento homossexual com uma cantora, contando com a compreensão do marido. .

1933. Seus escritos falam de amores homossexuais. Cria um alter ego masculino.
 
Hitler Chanceler e o nazismo tornado o regime oficial, os Mann deixam a Alemanha, escolhendo o exílio, e Annemarie os segue.

Dedica-se ao Jornalismo e parte , no outono, para uma viagem de sete meses pela Asia ( Turquia, Síria, Líbano, Palestina, Iraque e a antiga Persia ) na companhia da fotógrafa Marianne Breslaurer.1934. Acompanhando Klaus Mann(foto),participa do Congresso dos Escritores Soviéticos em Moscou. 

Terminado o Congresso, voltou à Persia para trabalhar como assistente, num campo arqueológico em Rhades.
 
Quando Annemarie voltou desta aventura, um  rumoroso processo, que envolvia ciúme, vingança pessoal e política, havia dizimado a amizade entre os Mann e os Schwarzwenbach, adeptos fiéis do regime nazista. 

Obrigada pela família a tomar posição, escolheu os Mann.Cada vez mais infuenciada pelos irmãos Mann e confusa com a atitude radical que acabava de tomar, Annemarie tenta, pela primeira vez, o suicídio.

1935. ( Primavera ) Recuperada do trauma e prosseguindo em sua vida nômade, encontra em Teheran o jovem diplomata francês Claude Clarac.
Procurando assumir uma postura “respeitável” e normal, Annemarie aceita o pedido de casamento. 

Fugindo do calor, o casal parte em exótica lua de mel para o Vale de Lar, onde está situado vulcão Damavand ( Irã - 5671 m.)
A paz interior duraria pouco. Depois de uma terrível crise depressiva, separa-se do marido e volta à Europa, para mais uma temporada de desintoxicação.
 

1938. A hostilidade da mãe, o afastamento dos Mann ( Erika estabelece-se nos Estados Unidos e Klaus mergulha fundo nos tóxicos ) e as crises existenciais servem como pano de fundo para o diagnóstico do psiquiatra Ludwig Binswanger:esquizofrenia.

Internada, Annemarie submete-se a tratamento na renomada Clínica Bellevue, em Yverdon 

1939. Parte de Genebra, a bordo de um Ford, em companhia da igualmente escritora, jornalista, fotógrafa e globe-trotter Ella Maillart, com o objetivo de chegar até Kaboul. Assim que atingem o destino, a notícia da Segunda Guerra Mundial acaba com os planos das viajantes.
 
A difícil aventura e a relação amorosa entre as duas mulheres extraordinárias ficaram fixadas para sempre. Sem ser identificada, Annemarie é Cristina, a jovem andrógina, revoltada e à frente de seu tempo, heroína do romance “La Voie cruelle” de Ella Maillard,1940. 

Annemarie , desejosa de renovar seu círculo socia,l começa a trabalhar para jornais americanos. e desperta uma paixão na escritora americana Carson Mc Culler.
Morre o pai na Suíça e ela não comparece ao funeral. Não havia mais lugar para ela entre a família e a mãe a aconselha a nunca mais voltar à Suíça.
Após tentar estrangular sua nova namorada, Margot von Opel, apela, pela segunda vez para o suicídio. Novamente internada num manicômio é autorizada a sair com a promessa de abandonar definitivamente os EEUU. 
E nunca mais viu os Mann.
 
Neste mesmo ano, vai para a África onde desejava se juntar ao exército de De Gaulle e colaborar com o governo da França Livre.
Tomada como espiã, fugiu para o interior seguindo o curso do Rio Congo, atravessando o país e chegando à região dos Grandes Lagos. 
 

Durante esta viagem solitária nas trevas da Africa, reencontra o marido em Tetuán. Os dois começam a tratar do divórcio mas acabam decidindo retomar a vida em comum.1942. 
Todos os projetos terminam com a morte prematura de Annemarie em 15 de novembro de 1942, após hemorragia cerebral, decorrente de uma simples queda de bicicleta, depois de longo período de inconsciência. 
1987. 

A partir dos esforços de Ella Maillart e do marido Claude Clarac - depois de muitos anos de esquecimento - a importância de Annemarie Schwarzenbachn para a vida cultural suíça foi resgatada com a publicação integral de sua obra ( romances, contos, artigos, reportagens, prosa lírica e autobiográfica ).

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