No dia em que a população de Cuba aprovou,num referendo, o casamento homoafetivo, a adoção por casais do mesmo sexo e barriga de aluguel
Nascido na aldeia de Holguín, Cuba, em 16 de julho de 1943, Reinaldo Arenas foi - durante anos - a vítima eletiva de Fidel Castro. No entanto, sua relação com a revolução cubana nem sempre foi conflituosa. Aos 15 anos, quando Havana foi tomada pelos rebeldes em 1º de janeiro de 1959, era guerrilheiro nas tropas de Castro que combatiam o ditador Fulgêncio Batista.
Criado no interior da Ilha, Arenas, que nunca conheceu o pai, manifestou desde cedo uma esplendorosa vocação literária que a família, vivendo nos limites da sobrevivência, não tinha condição de entender.
Em 1962, ainda no clima de liberdade cultural, escreveu seu primeiro romance quando estudava na Universidade de Havana e trabalhava na Biblioteca.
Participando de um concurso literário conheceu José Lezama, o grande poeta e ensaísta, que se tornou seu mentor e o ajudou, em 1967, a publicar seu livro.
“Celestino antes del alba” conta a a história de um menino pobre e limitado pela miséria que precisava utilizar a criatividade para sobreviver e inventou um companheiro imaginário, encarnação de seus desejos e necessidades.
Os dois mil exemplares logo se esgotaram, mas o regime exigia uma literatura mais engajada que contribuísse para a conscientização revolucionária.
Quando começou abertamente a perseguição aos homossexuais, Reinaldo Arenas foi declarado “transgressor, anticonvencional, favorável ao direito da livre-expressão e, portanto, antirevolucionário” e como consequência, censurado
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Seus manuscritos passaram a ser contrabandeados e eram imediatamente publicados, como ahistória do sacerdote mexicano Frei Sernamdo Teresa de Mier que, de acordo com a ótica surrealista do cubano, recebeu o título “El mundo alucinante” (1968).
Durante toda a década de 70, o único sinal da existência de Arenas foi a edição francesa da obra “El palacio de las blanquísimas mofetas” (1975).
Dois anos mais tarde sairiam as edições mexicana e espanhola.
Publicar sem a autorização da UNEAC ( Unión Nacional de Escritores y Artistas De Cuba ) era um delito.
E Arenas o cometeu .
A polícia política cubana conseguiu confiscar e destruir algumas de suas obras e ele foi declarado apátrida. Já uma celebridade mundial, o poeta enfrentava o veto do Estado em seu trabalho e em sua vida.
Mudando constantemente de endereço, trabalhava fazendo biscates para sobreviver.
Os "Marielitos"
Mariel é um povoado de Cuba, localizado na baía do mesmo nome, em Havana.
Em 1980, milhares de cubanos protagonizaram famosa partida do porto de Mariel para os Estados Unidos. Estes expatriados passaram a ser chamados de "marielitos".
"Os marielitos" era o grande grupo formado por dissidentes, criminosos e homossexuais.
Com total endosso do governo castrista, sob pressão dos cubanos já residentes em Miami e com a imigração americana fazendo vista grossa, aconteceu o êxodo de milhares de indesejáveis do regime.
O regime revolucionário castrista,mais tarde, explicou sua condescendência como tentativa de “depurar a sociedade e purificar a pátria. ”
Escritor desencantado
Instalado inicialmente em Miami, fundou uma revista chamada Mariel - apesar da fama de criminalidade que cercou o episódio, esta palavra sempre significou para Arenas o desejo de liberdade.
Mais tarde, já em New York e embriagado de liberdade, Reinaldo Arenas vivia na mesma velocidade com que escrevia.
Começou a produzir de forma obssessiva e prodigiosa novelas, histórias curtas, poesia, ensaios, artigos para jornais e peças dramáticas.
A experiência desoladora de viver num campo de concentração foi transformada em livro: El Central (1981 ).
Mas o preconceito, a segregação, o medo da delacão pelo “delito” de ser diferente e ter uma conduta sexual considerada imprópria transformaram o fervor revolucionário em desencanto e ressentimento.
Em 1987, aos 42 anos e no auge da potência intelectual, recebeu o diagnóstico de Aids.
O livro “El Portero”, de 1989, testemunha este momento de miséria e marginalizacão.
O prólogo de seu livro de poemas “Voluntad de vivir manifestandose” sintetiza seu desespero diante da situação :
“ O envelhecimento da miséria durante a tirania de Batista, o envelhecimento do poder sob Castro, o envelhecimento do dólar no capitalismo e, como se tudo isso ainda fôsse pouco, morei nos últimos nove anos na cidade mais populosa do mundo que agora sucumbe diante da praga mais descomunal do século XX ".
Antes que anoiteça
Com a certeza da chegada da morte e correndo contra o tempo,retomou a autobiografia iniciada quando vivia clandestino em Cuba, que intitulou “Antes que anoiteça”, já que tinha de escrever aproveitando ao máximo a luz do dia.
"Antes que anoiteça" foi publicado 1992, dois anos após o seu suicidio, consequência dos sofrimentos impostos pela Aids e pelos amargores do exílio.
Ali estavam condensadas suas experiências - violência, erotismo, política, homossexualidade e o compromisso de viver se manifestando.
O livro serviu como roteiro para o fime do mesmo nome, vencedor do Grande Prêmio do Juri no Festival de Veneza de 2000. Dirigido por Julian Schnabel e com Javier Bardem (interpretando Arenas) , Johnny Depp (em 2 papéis ) e Sean Penn.
"Marielito" e desertor cubano, “não desejando pedir a vida como esmola “ sozinho e sem dinheiro mesmo tendo seus livros como best sellers, cometeu suicídio no apartamento de Manhattan, New York, em 7 de dezembro de 1990.
Censurado em sua terra natal , escrever era um ato de fúria no qual ele subvertia todas as formas de dogmatismo e criava suas verdades absolutas.
Deixou um "Autoepitafio": "a vida é uma questão de risco ou de abstinência.
Ele escolheu correr o risco.
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