domingo, 19 de julho de 2015

"Reconstruindo as muralhas de Sodoma"- sobre ser homo na Bahia em1689

  Publicado na  coluna de Ancelmo Góis, no  O GLOBO. domingo,19/7/2016

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 "De Delgado a Malafaia

 

 As pessoas civilizadas condenam, com razão, a postura homofóbica de certas igrejas pentecostais no Brasil. Sobretudo, de alguns de seus pastores — como Silas Malafaia, telepregador que não esconde seus preconceitos, para quem homossexualismo é “doença”.

Mas, em 1689, na Bahia, berço do movimento LGBT brasileiro, a Igreja Católica condenou ao degredo Luiz Delgado, um violeiro de Évora, que, fugido das perseguições por sua condição de gay em Portugal, estabeleceu-se em Salvador como estanqueiro de tabaco.

As aventuras e desventuras de Delgado são reveladas em dissertação de mestrado do professor de História Matheus Rodrigues Pinto, 27 anos, defendida há pouco na UFF. Ele conta: “Delgado levava uma vida relativamente sossegada, passeando (na Salvador daquele tempo) ao lado de seu ‘sobrinho’, cobrindo-o de mimos e dormindo na mesma cama que ele, às vistas de sua mulher e da sociedade da época.”

Segundo o professor, uma testemunha relatou naqueles dias que a mulher do ex-violeiro até gostava da relação de Delgado com seu rapaz, pois, assim, o jovem “a descansava do marido, porque o beijava e o abraçava”.

— Delgado contava com certa tolerância tácita da sociedade baiana de então, embora fosse “afamado”. Sua sorte mudou quando foi preso, em 1689. Aí, sua fama e sua celebridade atuaram em seu desfavor, e abundaram testemunhas de suas aventuras sodomíticas. Nosso herói foi degredado pelo Santo Ofício para Angola e, depois, nada mais sabemos dele — diz o mestre.

Para o professor, cuja dissertação se chama “Reconstruindo as muralhas de Sodoma”, investidas homofóbicas como as de Malafaia, hoje, são reação às conquistas dos gays de lá para cá:

— A situação é imensamente melhor que há alguns anos, e temos de ter em conta a importância da religiosidade no país. Daqui a alguns anos, espero, todo esse descalabro homofóbico será uma vergonhosa lembrança.

Amém! "

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