sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Dr Harry Benjamin-Anjo da Guarda e Porta-Voz

 


Uma vida dedicada à diversidade sexual


Tia, da próxima vez a senhora traz batom e esmalte ?”, pediu  a travesti de rua depois de receber a refeição diária que uma querida amiga aí de São Paulo  distribui  aos necessitados. Perplexa, me ligou no dia seguinte, querendo saber como alguém vivendo naquele nível de miséria ainda poderia pensar em supérfluos e em vaidades. Respondi que aquela era uma tentativa quase final de preservar a auto estima  em meio à marginalidade.
Em  manifestação  na porta da Prefeitura de Barcelona, vi dezenas de prostitutas esconderem o rosto para as câmeras de TV, enquanto as drag queens, transexuais e travestis de caras limpas e descobertas gritavam palavras de ordem pelos seus legítimos direitos.
 A gente conhece a imagem definida de personalidades bem sucedidas – após enormes sofrimentos durante a transição - como Cocinnelle, Christine Jorgensen e as nossas Isabelita dos Patins, Rogéria, Roberta Close e Mayte Schneider, embora cenas mostradas pela mídia muitas vezes façam questão de enfocar detalhes embaraçosos e que parecem chocantes para o povão conservador.
Por trás de cada drama íntimo bem sucedido  ou da esperança de fechar a dolorosa  charada hormonal e psicológica  dos TTs, está a figura iluminada do Dr.  Harry Benjamin.

Anjo da Guarda

Sexólogo alemão naturalizado norte americano, muito conhecido por seu trabalho pioneiro com a transexualidade, morreu aos 101 anos (24 de agosto de 1986) depois de ter dedicado a vida inteira a desmitificar o que costuma ser tratado como estigma.   
Harry Benjamin nasceu em Berlim, em 12 de Janeiro de 1885.
Já na Universidade de Tübingen sentiu-se atraído pelos mistérios da sexualidade, levado pelo grande amigo Magnus Hirschfeld (1868-1935) cuja famosa monografia publicada em 1910, define o travestismo como uma escolha particular e pelo endocrinologista vienense Eugen Steinach, especialista em geriatria que foi o primeiro a estudar o papel do estrogêno e da testosterona  na produção das características sexuais secundárias.
Benjamin tornou-se um “gerontoterapista”, usando medicação injetável para rejuvenescer  e estimular a libido dos pacientes.
Terminados os estudos médicos em 1912, seguiu para os Estados Unidos para uma especialização em Pneumologia. Ao retornar à Alemanha, no início da Primeira Guerra Mundial,  seu navio interceptado e levado para a Inglaterra,
Sua condição de cidadão alemão levou-o, por pouco tempo, à prisão. Logo, retornou para os  Estados Unidos, tornou-se cidadão norte-americano e abriu um consultório de grande respeitabilidade e reputação.
Nos anos 40, passando um verão em São Francisco, aproveitou para se inteirar das novidades na administração de medicação hormonal e percebeu que seus colegas se recusavam a administrá-la aos transgêneros.
Quando da  cirurgia de Christine Jorgensen na Dinamarca, viu-se no centro das discussões sobre transsexualidade (termo cunhado por David O. Cauldwell, em 1949).
 Prescrevia hormônios para os pacientes particulares e ajudava nas cirurgias de reconstrução. Em 1956,  publicou  “O fenômeno transexual”, cujos paradigmas ainda estão em uso.
Foi um medico modelo. Em  sua honra, a associação que congrega médicos, psicólogos  e psiquiatras que assistem  pacientes transgêneros foi denominada “Associação Internacional da Diversidade de Gêneros Harry  Benjamin”  (HBIGDA).

Teve um casamento de mais de sessenta anos com sua amada Gretchen, a quem dedicou toda obra e toda pesquisa e morreu em Nova York aos 101 anos, em  plena atividade profissional

A tese de Benjamin

Em 1954,  Harry Benjamin  procurou estabelecer a diferença. Enquanto o transexual não aceita seu sexo biológico, tentando adequá-lo ao sexo emocional; o travesti aceita. E convive com as possibilidades de seu corpo, ficando assim mais em contato com sua sexualidade. Os órgãos genitais são o centro de seu prazer, como para qualquer outro homem.
Os estudos sugeriam, inclusive, que um travesti não é, necessariamente, um homossexual. Se o homem hetero que aprecia o travestismo tiver uma companheira tolerante - o que é muito raro - pode resolver suas necessidades psicológicas dentro casa mesmo.
Com freqüência maior que se imagina, muitos travestis, casados ou solteiros, estão circulando por aí vestindo lingerie feminina, por baixo de seus ternos e gravatas. Para um transformista profissional, entretanto, usar roupas femininas faz parte do trabalho.

A História de Coccinelle

Jacques Charles Dufresnoy nasceu em 23/8/1931, em Paris. Desde os 4 anos,  sentia-se desconfortável com seu corpo e, num carnaval, usando uma fantasia vermelha com bolinhas pretas foi chamado de Coccinelle (joaninha) e  assumiu o apelido.
Em 1953, começou a trabalhar no cabaré “Chez Madame Arthur”, onde sua mãe vendia flores. O jornal “France Soir” chamou a atenção para seu talento e logo Coccinelle se tornou  estrela no “Carrousel de Paris”.
Multidões iam ver o” fenômeno”, que logo se tornou atração internacional.
Numa de suas turnês, quase por acaso, a artista ficou sabendo que um ginecologista em Marrocos praticava uma intervenção cirúrgica que transformava um homem em mulher.
Coccinelle foi até lá para marcar consulta com o Dr Burou.
A cirurgia, realizada em 1958, foi um sucesso e, ao acordar da anestesia e ouvir “Bonjour, Mademoiselle” (bom dia, senhorita!) Cocinnelle conta que se sentiu em perfeita harmonia interior e exterior.  
A primeira pessoa a mudar de sexo na França trouxe a fortuna à conta bancária do cirurgião. Jornalistas de todo o mundo contaram a incrível história.
 Em  junho de1963, Bruno Coquatrix  convidou-a para estrelar o show  " Cherchez la Femme” (Procure a Mulher) no “Olympia”, templo sagrado da arte francesa.
Terminada a temporada, convites choveram de todas as partes.
Percorreu a Alemanha de ponta a  ponta, contratada pelo “Chez nous”, famosa casa noturna de Berlim, onde viveu durante 9 anos.
Quando estava pronta para estrelar um show sobre sua vida no “Casino de Paris”, a Guerra do Golfo impediu  Coccinelle - que seguiu um rígido regime para emagrecer e se submeteu a várias cirurgias plásticas - de ver todo seu esforço compensado.
Decepcionada, resolveu mudar-se para Marselha, sul da França.  Ali, em 1994, foi fundada pela atriz a  “ASSOCIATION DEVENIR FEMME “ (Associação Tornar-se Mulher). 
A Associação se propõe a ajudar transexuais que não tiveram a mesma oportunidade de Coccinelle que, em 2000, se aposentou da carreira artística.
Faleceu em 31 de agosto de 2006.

Ex-pracinha vira beleza loura

A  manchete do  New York Daily News “Ex GI becomes Blonde Beauty” fez com que Christine Jorgensen, primeiro transexual  masculino para feminino submetida a cirurgia  comprovadamente bem sucedida, ganhasse status  de celebridade, sendo escolhida  a  Mulher do Ano.
O tímido filho de imigrantes dinamarqueses, nascido em 1926, teve uma infância normal e feliz  ao lado da irmã,  mas, desde  muito cedo, começou a  experimentar os tormentos  da transexualidade: a estranha sensação de  ter  cromossomos, hormônios e genitais de um sexo e a convicção íntima de pertencer ao gênero oposto.
Seu corpo já mandava as mensagens da confusão sexual.  Era muito magro, frágil e não tinha pelos no peito, braços e pernas.
Convocado pelo Exército Americano durante a 2ª Guerra Mundial, depois do Armistício  serviu 14 meses num cargo burocrático, o que  lhe possibilitou  contato com vasta biblioteca.
Durante anos, empenhou-se numa pesquisa independente sobre cirurgia para mudança de sexo, fez cursos de fotografia e leu tudo que estava ao alcance sobre hormônios sexuais e desequilíbrios  glandulares.    
Através de um amigo médico tomou conhecimento de que cirurgias como a que procurava já vinham sendo realizadas na Dinamarca,pela equipe do Dr. Christian Hamburger, o psiquiatra  Stürup e os cirurgiões  Poul Fogh-Andersen e Erling Dahl Iversen.

Ela desejava que sua trajetória  de homem para mulher fosse uma coisa privada, mas a indiscrição de um amigo da família trouxe a  notoriedade e o assédio da mídia.  Transformou-se numa digna embaixatriz da emergente comunidade transexual. Quinhentos milhões  de palavras ( o correspondente a 15 livros de tamanho médio) foram usadas pela imprensa mundial, em 1953,  para registrar os resultados da primeira cirurgia de mudança de sexo comprovadamente bem sucedida

Abriram-se as portas para uma fulgurante carreira no show business  e Christine Jorgensen passou o resto de sua vida sob luzes de palcos. Atuou no Orpheum Theater, em Los Angeles narrando um documentário que dirigiu e filmou na Dinamarca.

Trabalhou em casas noturnas e cassinos. Tornou-se  cantora e apresentadora de talk shows.
Escreveu um livro autobiográfico em 1967 - “A Personal Autobiography” - editado pela Cleis Press que continua sendo um sucesso de vendas até hoje e pode ser encomendado em sites de livrarias pela internet.
 Morreu em de câncer em 1989, vinte e três dias antes de completar 63 anos.
 

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