Uma
vida dedicada à diversidade sexual
Tia, da próxima vez a senhora traz
batom e esmalte ?”, pediu
a travesti de rua depois de receber a refeição diária que uma querida
amiga aí de São Paulo
distribui aos necessitados.
Perplexa, me ligou no dia seguinte, querendo saber como alguém vivendo naquele
nível de miséria ainda poderia pensar em supérfluos e em vaidades. Respondi que
aquela era uma tentativa quase final de preservar a auto estima em meio à marginalidade.
Em manifestação na porta da Prefeitura de Barcelona, vi dezenas de
prostitutas esconderem o rosto para as câmeras de TV, enquanto as drag queens,
transexuais e travestis de caras limpas e descobertas gritavam palavras de
ordem pelos seus legítimos direitos.
A gente conhece a imagem definida de
personalidades bem sucedidas – após enormes sofrimentos durante a transição -
como Cocinnelle, Christine Jorgensen e as nossas Isabelita dos Patins, Rogéria,
Roberta Close e Mayte Schneider, embora cenas mostradas pela mídia muitas vezes
façam questão de enfocar detalhes embaraçosos e que parecem chocantes para o
povão conservador.
Por
trás de cada drama íntimo bem sucedido
ou da esperança de fechar a dolorosa charada hormonal e psicológica dos TTs, está a figura iluminada do Dr. Harry Benjamin.
Anjo da Guarda
Sexólogo
alemão naturalizado norte americano, muito conhecido por seu trabalho pioneiro
com a transexualidade, morreu aos 101 anos (24 de agosto de 1986)
depois de ter dedicado a vida inteira a desmitificar o que costuma ser tratado
como estigma.
Harry
Benjamin nasceu em Berlim, em 12 de Janeiro de 1885.
Já na
Universidade de Tübingen sentiu-se atraído pelos mistérios da sexualidade,
levado pelo grande amigo Magnus Hirschfeld (1868-1935) cuja famosa monografia publicada em 1910, define o travestismo como uma
escolha particular e pelo endocrinologista vienense Eugen Steinach, especialista em
geriatria que foi o primeiro a estudar o papel do estrogêno e da
testosterona na produção das
características sexuais secundárias.
Benjamin
tornou-se um “gerontoterapista”, usando medicação injetável para
rejuvenescer e estimular a libido
dos pacientes.
Terminados
os estudos médicos em 1912, seguiu para os Estados Unidos para uma
especialização em Pneumologia. Ao retornar à Alemanha, no início da Primeira
Guerra Mundial, seu navio
interceptado e levado para a Inglaterra,
Sua condição
de cidadão alemão levou-o, por pouco tempo, à prisão. Logo, retornou para
os Estados Unidos, tornou-se
cidadão norte-americano e abriu um consultório de grande respeitabilidade e
reputação.
Nos anos 40, passando um verão em São Francisco, aproveitou para se inteirar
das novidades na administração de medicação hormonal e percebeu que seus
colegas se recusavam a administrá-la aos transgêneros.
Quando
da cirurgia de Christine Jorgensen
na Dinamarca, viu-se no centro das discussões sobre transsexualidade (termo
cunhado por David O. Cauldwell, em 1949).
Prescrevia hormônios para os pacientes
particulares e ajudava nas cirurgias de reconstrução. Em 1956, publicou “O fenômeno transexual”, cujos paradigmas ainda estão em
uso.
Foi um
medico modelo. Em sua honra, a
associação que congrega médicos, psicólogos e psiquiatras que assistem pacientes transgêneros foi denominada “Associação
Internacional da Diversidade de Gêneros Harry Benjamin”
(HBIGDA).
Teve um
casamento de mais de sessenta anos com sua amada Gretchen, a quem dedicou toda
obra e toda pesquisa e morreu em Nova York aos 101 anos, em plena atividade profissional
A
tese de Benjamin
Em 1954, Harry Benjamin
procurou estabelecer a diferença. Enquanto o transexual não aceita seu
sexo biológico, tentando adequá-lo ao sexo emocional; o travesti aceita. E
convive com as possibilidades de seu corpo, ficando assim mais em contato com
sua sexualidade. Os órgãos genitais são o centro de seu prazer, como para
qualquer outro homem.
Os estudos sugeriam, inclusive, que um
travesti não é, necessariamente, um homossexual. Se o homem hetero que aprecia
o travestismo tiver uma companheira tolerante - o que é muito raro - pode
resolver suas necessidades psicológicas dentro casa mesmo.
Com freqüência maior que se imagina,
muitos travestis, casados ou solteiros, estão circulando por aí vestindo
lingerie feminina, por baixo de seus ternos e gravatas. Para um transformista
profissional, entretanto, usar roupas femininas faz parte do trabalho.
A
História de Coccinelle
Jacques Charles Dufresnoy nasceu em
23/8/1931, em Paris. Desde os 4 anos,
sentia-se desconfortável com seu corpo e, num carnaval, usando uma
fantasia vermelha com bolinhas pretas foi chamado de Coccinelle (joaninha)
e assumiu o apelido.
Em 1953, começou a trabalhar no cabaré
“Chez Madame Arthur”, onde sua mãe vendia flores. O jornal “France Soir” chamou
a atenção para seu talento e logo Coccinelle se tornou estrela no “Carrousel de Paris”.
Multidões iam ver o” fenômeno”, que logo
se tornou atração internacional.
Numa de suas turnês, quase por acaso, a
artista ficou sabendo que um ginecologista em Marrocos praticava uma intervenção
cirúrgica que transformava um homem em mulher.
Coccinelle foi até lá para marcar consulta
com o Dr Burou.
A cirurgia, realizada em 1958, foi um
sucesso e, ao acordar da anestesia e ouvir “Bonjour, Mademoiselle” (bom dia,
senhorita!) Cocinnelle conta que se sentiu em perfeita harmonia interior e
exterior.
A primeira pessoa a mudar de sexo na
França trouxe a fortuna à conta bancária do cirurgião. Jornalistas de todo o
mundo contaram a incrível história.
Em junho de1963,
Bruno Coquatrix convidou-a para
estrelar o show " Cherchez la
Femme” (Procure a Mulher) no “Olympia”, templo sagrado da arte francesa.
Terminada a temporada, convites choveram
de todas as partes.
Percorreu a Alemanha de ponta a ponta, contratada pelo “Chez nous”,
famosa casa noturna de Berlim, onde viveu durante 9 anos.
Quando estava pronta para estrelar um show
sobre sua vida no “Casino de Paris”, a Guerra do Golfo impediu Coccinelle - que seguiu um rígido
regime para emagrecer e se submeteu a várias cirurgias plásticas - de ver todo
seu esforço compensado.
Decepcionada, resolveu mudar-se para
Marselha, sul da França. Ali, em
1994, foi fundada pela atriz a
“ASSOCIATION DEVENIR FEMME “ (Associação Tornar-se Mulher).
A Associação se propõe a ajudar
transexuais que não tiveram a mesma oportunidade de Coccinelle que, em 2000, se
aposentou da carreira artística.
Faleceu em 31 de agosto de 2006.
Ex-pracinha vira beleza loura
A
manchete do New York Daily
News “Ex GI becomes Blonde Beauty” fez com que Christine Jorgensen, primeiro
transexual masculino para feminino
submetida a cirurgia
comprovadamente bem sucedida, ganhasse status de celebridade, sendo escolhida a Mulher do
Ano.
O tímido filho de imigrantes
dinamarqueses, nascido em 1926, teve uma infância normal e feliz ao lado da irmã, mas, desde muito cedo, começou a
experimentar os tormentos
da transexualidade: a estranha sensação de ter
cromossomos, hormônios e genitais de um sexo e a convicção íntima de
pertencer ao gênero oposto.
Seu corpo já mandava as mensagens da
confusão sexual. Era muito magro,
frágil e não tinha pelos no peito, braços e pernas.
Convocado pelo Exército Americano durante
a 2ª Guerra Mundial, depois do Armistício
serviu 14 meses num cargo burocrático, o que lhe possibilitou
contato com vasta biblioteca.
Durante anos, empenhou-se numa pesquisa independente sobre cirurgia para mudança de sexo, fez cursos de fotografia e leu tudo que estava ao alcance sobre hormônios sexuais e desequilíbrios glandulares.
Durante anos, empenhou-se numa pesquisa independente sobre cirurgia para mudança de sexo, fez cursos de fotografia e leu tudo que estava ao alcance sobre hormônios sexuais e desequilíbrios glandulares.
Através de um amigo médico tomou
conhecimento de que cirurgias como a que procurava já vinham sendo realizadas
na Dinamarca,pela equipe do Dr. Christian Hamburger, o psiquiatra Stürup e os cirurgiões Poul Fogh-Andersen e Erling Dahl
Iversen.
Ela desejava que sua trajetória de homem para mulher fosse uma coisa
privada, mas a indiscrição de um amigo da família trouxe a notoriedade e o assédio da mídia. Transformou-se numa digna embaixatriz
da emergente comunidade transexual. Quinhentos milhões de palavras ( o correspondente a 15
livros de tamanho médio) foram usadas pela imprensa mundial, em 1953, para registrar os resultados da
primeira cirurgia de mudança de sexo comprovadamente bem sucedida
Abriram-se as portas para uma fulgurante
carreira no show business e
Christine Jorgensen passou o resto de sua vida sob luzes de palcos. Atuou no
Orpheum Theater, em Los Angeles narrando um documentário que dirigiu e filmou
na Dinamarca.
Trabalhou em casas noturnas e cassinos.
Tornou-se cantora e apresentadora
de talk shows.
Escreveu um livro autobiográfico em 1967 -
“A Personal Autobiography” - editado pela Cleis Press que continua sendo um
sucesso de vendas até hoje e pode ser encomendado em sites de livrarias pela
internet.
Morreu em de câncer em 1989, vinte e três dias antes de
completar 63 anos.
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